quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

as crianças estão de férias
escuto suas vozes como se fossem fantasmas
dentro deste apartamento tudo desaba
em centímetros
quais preocupações metafísicas caem
poeiras reais e com elas alergias

adultos também estão de férias
seus gritos inescrupulosos atravessam
os muros e camadas atmosféricas

todos com alguma espectativa
e um único medo

o fracasso

(ainda bem
tudo voltará ao normal
segunda-feira)

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

eremita

o som fogos no deserto
você chegou na manhã
você escutou você mesmo
pela primeira vez

qual o risco que nos traz ao mundo
no deserto ou no mar
somos sozinhos

com nossas mães em algum lugar
que acontece se tombar
no mar destino

glassy-eyed

querido, homem, querido
que tenta olhar pela janela e
ver o céu e vê outras janelas
e ver o seu
Sol e os demais astros, querido
homem que vê windows
ao tentar ser seu céu
querido, primo, querido,
irmão, filho
em qual local estamos agora
sem ela, brincos
redondos camafeus
subindo aquele morro do fogo
lembro desse toque
iuna
subindo pelas estátuas e
lagos parados
e seu corpo tremelicando
verificando a urgência
do quase
seu sopro de afronto

quase morre atropelado

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

seus dedos feridos de tanta angústia
a água arde
e o silêncio...

surge um monstro sem cabeça
um deus antropomórfico negado
legado das cidades, aglomerados

quem compreende esse dia
quem um dia compreendeu
quem o corrompe

o silêncio
na velocidade da luz
a mais veloz

propaga
até que surga um choro
do nascimento

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

esses tempos da cigarra
da luz intermediária
do nascer e do morrer

no dia
na Urca
vi uma

cantando numa árvore
quatro dedos de bicho

um ano depois
outra morta

mas o coletivo cuida do uno
uníssimo som
dá conta
porque em círculo não há ponto cego

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

com esta poesia

quero me contentar
com pouco
vendo brotar
tubérculos na geladeira
luzes de natal na mente
pássaros, biomas
virtuais

com muito
quero me contentar
hoje treino, amanhã
qual será meu contento
serei-areia-sendento
suprimentos de sons
blues e poeira
sei, quero tentar

com amor,
feliz natal

assinatura.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

sopapo
esquiva
só papo
língua
órgãos
cabaça
arco

estamos conversando
olhando nos olhos
como quiser
o grande homem
é uma mulher

é a androginia
cabaça
arco

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

locação

saimos sem saber da paisagem que vem
sabemos só que nossas imagens mentais
mentem descaradamente
e que nossa lembrança de primeira viagem
é um filme de única exibição

e ainda chove
navi oruali
nas pedreiras
ainda chove
e vamos seguindo
antes que o toró caia
vamos pro galinheiro
se abrigar numa asa

eu que era criança como você
e hoje me calei mais

eram os anos novos se adiantando
antes do seu tempo de virada

velho ano novo chegando

adiantamento de planos
antes do ano começar
o outro termina

o que vamos colocar
naquilo que falta
na síncopa?

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

quero saber quem vai querer o desconforto
quem catalogará o dia após outro
quem olhará para si com a desconfiança
de quem vê o ataque do outro lado da rua
num passo de animal flexionando joelhos
sobrepondo o medo próprio numa atitude de punho fechado
e igualando o salto marcado na vítima
com o pulo dela para trás

um tremor que sobe pelas pernas e embrulha a barriga

a face mais sincera
é a do medo

nenhum espelho, talvez vitrines
câmeras de vigilância
maps e vistas mecânicas

na floresta só há a coruja
e eu quero é ver
quem olha dentro dos seus olhos noturnos
e a adota como filha
sem levá-la para casa

eu quero é ver a cara
de quem mora no acaso
e se liberta em seu corpo sem órgãos

domingo, 5 de dezembro de 2010

sobre o valor da amizade

tem dia que temos a graça
de receber um ensinamento
com um mestre bem apresentado
discreto em preto
sedento de nada

o silêncio

Chuva

lama abaixo
água que mistura
esse lixo, esses galhos
pessoas e ruas
cartas de baralho
destinos requentados
a poeira que antes se mantinha
sem nos sujar tanto

essa chuva é mesmo de fim de dia
de fim de semana, domingo
o que resta da folga
surgindo uma segunda cheia de quê?

água abaixo
dilui o que temos
semeia o que plantamos
e dispensa comentário
ela diz tudo por nós
meros humanos