sexta-feira, 8 de março de 2013

Cemitério de Pássaros







Cemitério dos pássaros
Paquetá
  2013




Onde tudo silencia, o tempo que escorre recobre cada recanto esquecido. O canto dos pássaros restabelece naqueles que os escutam atenciosamente uma nova ordem para os acontecimentos cotidianos.
Lá, naquela ilha no fundo da baía, esquecida na poluição que é a nossa própria sujeira existencial, existe passarinhos brancos e pretos que ao fim da tarde, abrem e balançam freneticamente suas asas, em grupos, diante do Sol. 
Da gaiola já sabemos bem. Esse dispositivo de terror camuflado pela carência humana de companhia e má compreensão da beleza. O passarinho, não sei, faz cara de que tudo entende e que tem pena.
Mas nada mais humano que um Cemitério de Pássaros! Porque com covas se enterram os corpos dos homens que passaram nessa terra, mas os passarinhos caem diretamente sobre ela porque assim são. Como tudo o que vive, umidade da decomposição, e depois, ressecam-se cada vez mais os ossos.
Um cemitério de pássaros. Ao lado do cemitério humano, pequenas tumbas brancas adornam esse recanto, com uma pracinha amistosa, luz amarela a noite, sombra das árvores de dia. Uma instalação que fala de coisas tão pequenas e sutis que passam despercebidas. Silêncio entrecortado pelos risos das crianças. Ausência intermitente de um pequeno passarinho. Um dia sonhei que um bicava minha cabeça com uma delicadeza que me dominou. Acordei chorando.
A fotografia guardou a pequena casa desse sonho de um velhinho. Dizem que ele está vivo. Talvez tenha morrido ontem, ou agora mesmo. Uma reportagem de jornal foi em sua busca tirar fotos e provas da verdade; que realmente existe um velhinho que cuida de um cemitério de pássaros. O lusco-fusco da existência humana transmutada na do passarinho, pois essas forças estão em relação, essa coisa mórbida, pequena, tímida que é a covinha de cada um. Quem poderá abri-la a não ser as crianças que correm sobre elas, sem pudor nenhum, nem da morte, nem desse, nem do cemitério ao lado, dos homens. Crianças que não se intimidam nem com fotos nem com covas.
Dedico esse ensaio ao meu pai, Jeová Cruz Maciel, meu passarinho.

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